Tem gente que não sabe cantar. Tem gente que não sabe estalar os dedos. Tem gente que não sabe dar coió — tem gente que nem sabe o que é coió. Eu já não sei piscar. Claro que todo mundo pisca involuntariamente para lubrificar os olhos, mas estou falando aqui do piscar intencional para paquerar ou simplesmente dar um sinal para uma outra pessoa. Pois não sei piscar. Quero piscar um olho, pisco os dois. Lembram-se daquela brincadeira de Detetive, Vítima e Ladrão, em que o Ladrão fazia suas Vítimas piscando o olho e o Detetive ficava tentando descobrir quem era o piscador? Nunca me dei bem naquela brincadeira, pelo menos não quando eu era o Ladrão. As prováveis Vítimas não se deixavam atingir pelo meu piscar deficiente. Piscar é um charme. É de apaixonar. E, se as intenções são só amigáveis, piscar é capaz de proporcionar uma duradoura amizade. Então estou assim, meio apaixonada, meio melhor amiga de quem piscou para mim essa semana: o Céu, com seu olho de Lua. Foi um piscar lento, como são as coisas do Céu. Começou na minha derradeira volta do curso e só terminou quase uma hora depois. Deu tempo de chegar em casa, preparar um miojo rápido. Um piscar perfeito, desses de quem sabe mesmo o que faz — coisa de Céu. Nesse demorado piscar, enquanto a Lua me apaixonava, o Céu mandava o sinal: "É isso aí, tá no caminho certo. Continue firme. Bom trabalho". E eu quis piscar de volta, dizer que havia entendido o recado, confirmar a amizade. Mas, como já disse, eu canto, estalo dedo e faço coió, mas piscar não é o meu forte. Sorte minha que o Céu é um sujeito esperto, sabedor das coisas. Ele com certeza percebeu que uma daquelas minhas piscadelas, supostamente involuntária, não foi apenas para lubrificar os olhos.